Lair Ribeiro e o polêmico vídeo sobre o colesterol

Tem circulado na internet, principalmente em páginas de facebook de colegas médicos comentários sobre um vídeo do Dr Lair Ribeiro que pontua como mentira da ciência a informação de que colesterol alto causa infarto. Eu mesmo já fui perguntado várias vezes sobre esse vídeo. Queria dizer aqui algumas opiniões pessoais sobre o assunto:
Quem disse que colesterol alto causa infarto?
Dos primeiros estudos que pautam da década de 50 do século passado, em especial uma grande coorte que é seguida há décadas em Framingham nos Estados Unidos, concluimos que há correlação estatística entre a fração LDL do colesterol elevada e infarto e a fração HDL do colesterol reduzida e infarto. Ou seja, LDL alto e HDL baixo teriam relação com infarto. Esses achados foram confirmados com diversos outros estudos com milhares e milhares de pacientes ao redor do mundo, com diferentes etnias e diferentes grupos de pesquisa.
A questão é responder a pergunta: essa relação de colesterol LDL alta e/ou HDL baixo e infarto pode ser revertida com o uso de medicações?
É nessa questão que o vídeo se concentra. E existem marcos científicos muito fortes em alguns tópicos como aspirina no infarto do fim da década de 80, trombolítico e infarto, da mesma época, inibidores da enzima conversora da angiotensina e betabloqueadores para insuficiência cardíaca, anticoagulação para alguns casos de fibrilação atrial, enfim, assim como todos esses marcos, a redução do LDL para prevenção da progressão da aterosclerose e redução de eventos agudos como infarto e AVC é muito clara. Em especial foi feito um artigo que foi publicado em 2010 com um poder científico muito grande por causa da sua metodologia e do número de pacientes que o estudo engloba (170 mil) em um grupo chamado Cholesterol Treatment Trialists’ (CTT) que demonstrou redução da taxa anual de eventos (morte, infarto, avc ou cirurgia de revascularização do miocárdio) da ondem de 20% para cada 1mmol/L de colesterol LDL. Ou seja, é muita coisa. Sim, acredite, é um benefício enorme. Apesar do autor discordar, o embasamento científico é sim, conclusivo e forte o suficiente para ser aceito pela comunidade científica.
O outro ponto que você pode perguntar é: e o HDL? também tem o mesmo benefício? E daí vem a resposta que você pode estranhar: não. Até agora, não conseguimos obter benefícios com os chamados "desfechos duros", ou seja, morte, infarto, avc e revascularização do miocárdio, após tratamentos para aumento do HDL. As últimas investidas foram frustradas com os estudos AIM-HIGH e THRIVE que usavam niacina e não deram certo. Não houve redução dos desfechos do estudo e fizeram com que as esperanças fossem depositadas de novo em mais redução do colesterol LDL.
Esse ano, a diretriz que trata do assunto já foi revista e a meta para pacientes de muito alto risco caíram de 70mg/dL de LDL para 50mg/dL. Há nova esperança depositada em nova classe medicamentosa.
As perguntas que restam são: até qual número chegaremos? Se quanto mais baixo melhor, colesterol LDL não serve para nada?
Não sabemos até que número chegaremos nos próximos anos, principalmente porque não sabemos os verdadeiros riscos , ou o risco x benefício de um LDL absurdamente baixo como 10mg/dL por exemplo, principalmente porque o colesterol tem função específica no organismo para a produção de hormônios e parede celular, por exemplo.
Um erro importante da cardiologia do século passado foi associar de maneira muito forte o consumo de gorduras com o colesterol alto. De alguma maneira, aqueles que tratam do assunto para o grande público não dividiram a culpa das gorduras saturadas com os carboidratos refinados. O resultado foi uma sociedade que consome as duas coisas de maneira muito errada.
Quero concluir então que discordo veementemente do Dr Lair Ribeiro. Acredito que ele lança de várias técnicas de oratória que tentam construir uma sensação de autoridade para polemizar, e polemicas assim sempre rendem muitos cliques na internet. Enfim, precisamos tomar cuidado com as informações que vimos. Recentemente um paciente meu que tem altíssimo risco cardiovascular interrompeu o uso de estatina, que é uma medicação para tratar o colesterol por conta desses vídeos.
O que fazer então? Procure sempre um médico que você confia, acompanhe com ele e pergunte das questões de risco x benefício com o uso contínuo de medicações para o colesterol, tente entender os motivos que fazem com que ele indique ou contra indique esses tratamentos e viva uma vida equilibrada com exercícios e boa dieta. Abaixo eu coloquei uma série de vídeos que tratam de assuntos afins para esclarecer e te informar mais sobre isso.